sexta-feira, 27 de julho de 2012

BOLO SOUZA LEÃO


No distante povoado de Muribeca, encravado no município de Jaboatão dos Guararapes, no belo Estado de Pernambuco, havia, há muitos e muitos anos, um engenho de onde saíam, além dos produtos naturais de um engenho, delícias caseiras – especialmente doces – que conquistariam todo o Estado e fariam fama no resto do país. O coronel Agostinho Bezerra da Silva Cavalcanti era o orgulhoso senhor do Engenho São Bartolomeu, mas a responsável pelas delícias caseiras era sua esposa, Dona Rita de Cássia Souza Leão Bezerra Cavalcanti. O bolo que levava o nome do engenho ( “Bolo São Bartolomeu”) ganhou fama e até hoje é servido nas festividades pernambucanas.
A casa do Engenho São Bartolomeu, em foto recente
Mas o maior legado de Dona Rita de Cássia para a cultura pernambucana é, sem dúvida, o “Bolo Souza Leão”, considerado o mais aristocrático bolo nordestino. Corria o ano de 1859 quando, de passagem pelo Estado, foi servido a Dom Pedro II e a sua esposa, D. Tereza Cristina, fatias do “Bolo Souza Leão”. Dom Pedro II e toda sua comitiva ficaram maravilhados com a iguaria, e até hoje manda a tradição que fatias desse bolo sejam servidas apenas em pratos de porcelana ou cristal. Para se ter uma ideia da força desta tradição, no dia 22 de maio de 2008, foi sancionada pelo governador Eduardo Campos, a Lei nº 357/2007, que deu ao “Bolo Souza Leão” o título de Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado de Pernambuco.
O Bolo Souza Leão 
Cozinheira de mão cheia, Dona Rita de Cássia foi adaptando as receitas de sua cozinha (naquela época, a quase totalidade das receitas em território nacional eram da culinária portuguesa, utilizando ingredientes europeus) para os novos padrões gastronômicos que surgiam naturalmente. Como no restante do país, a gastronomia pernambucana é resultado da fantástica mistura das culturas europeia, africana e indígena. Na cozinha do Engenho São Bartolomeu, o trigo foi substituído pela massa de mandioca, a manteiga francesa “Le Pelletier” perdeu espaço para a manteiga fabricada na própria cozinha, a aguardente portuguesa de uva foi alegremente trocada pela cachaça produzida a partir do caldo da primeira fervura da cana moída no próprio engenho. Há quem diga que o uso de produtos genuinamente nacionais era um gesto de compromisso com a terra, mas provavelmente foi apenas um natural processo de formação de nossa cultura.
O brasão usado por alguns ramos da família Souza Leão
A receita original do “Bolo Souza Leão” é reivindicada pelos diversos ramos da família Souza Leão espalhados por Pernambuco - os descendentes da família Souza Leão são provenientes de onze engenhos do Estado - e provavelmente nunca teremos certeza de qual receita é realmente a original. Gilberto Freyre, em seu livro “Açúcar”, escreve: “Consegui várias receitas desse manjar, mas todas se contradizem, a ponto de me fazerem duvidar da existência de um bolo Sousa Leão ortodoxo [verdadeiro]. Consegui-as quase como quem violasse segredos maçônicos”. (Freyre, 1987, p. 77).  Mas isso não é motivo para você chorar, e sim para comemorar, afinal, existem várias receitas do “Bolo Souza Leão” e todas elas são muito saborosas.
A primeira edição do livro de Gilberto Freyre, de 1939
Edição atualizada do livro de Freyre
As diversas receitas do Bolo Souza Leão têm proporções discrepantes na quantidade dos ingredientes: algumas chegam a pedir um quilo de manteiga, em uma outra são necessários 450 gramas; uma fala em 12 gemas, outras indicam 15 ou 18. Sem falar na quantidade de açúcar e leite de coco. Há receitas com leite de sete cocos, outras quatro ou dois. No final tem-se vários bolos, que têm em comum o fato de assemelhar-se a um pudim e são muito saborosos. Vou colocar aqui apenas uma receita, mas você encontra muitas outras livros e internet afora. Escolha a receita e mãos à obra!

RECEITA 

 Bolo Souza Leão 

Ingredientes:
- 18 gemas;
- 6 xícaras de leite de coco puro;
- 1 kg de açúcar;
- 1 kg de massa de mandioca;
- 2 colheres de sopa de manteiga;
- Sal a gosto. 
Preparo:
- Com açúcar, faça uma calda em ponto de fio;
- Junte a manteiga e depois as gemas;
- Acrescente a massa lavada, espremida e peneirada. E, por fim, leite de coco e sal a gosto;
- Passe toda a mistura em peneira muito fina, várias vezes;
- Coloque em fôrma untada com manteiga e forrada com papel impermeável, também untado. Asse em forno regular.




4 comentários:

  1. Sou pernambucano. Sempre que posso, estou numa cafeteria com uma fatia dessa manjar para acompanhar meu espresso. Gostei muito dessa matéria, em especial pela citação ao mestre de Apipucos.

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  2. Uma fatia desse bolo com um cafezinho... meu deus!!!

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    1. Obrigado, Kleiton. Você deve ter orgulho da sua terra, linda e de sabores fantásticos! e você tem razão, um cafezinho é a companhia ideal do Souza Leão.

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  3. Sou de Portugal, passei por aqui e fiquei curiosa não só pela iguaria mas também pelo brasão usado pelos Sousa Leão. Penso que seja o Brasão levada de Portugal pelos Sousa do Prado, uma familia senhorial, muito próxima da casal real e ao que tudo indica levou descendentes para o Brasil. Alguém sabe quais foram? Estou a fazer um trabalho sobre os Sousa do Prado em Portugal. A quem me puder dar pistas, deixo o meu e-mail: anacalheiros3@sapo.pt
    Obrigada

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