A razão de eu escrever este blog nunca foi a de relatar experiências pessoais, então vou camuflar este texto com um assunto de grande importância. Pode mudar o título para “A IMPORTÂNCIA DO PROFESSOR NA FORMAÇÃO DO ALUNO”, se desejar.
Na verdade já comentei um pouco sobre o assunto, nos textos “O Mito do Chefe Carrasco” e “Lições de Cima”, mas tenho um pouquinho mais a dizer. A experiência de dar aulas de panificação na Fundação Casa (antiga FEBEM) tem sido muito gratificante, com momentos de tensão, admito. A visão de moleques gritando e correndo pelo pátio em volta da sala onde estou dando aula, suas faces entre os vidros quebrados por onde os alunos tentam passar qualquer coisa escondido do monitor e do segurança, desde um copo com leite, um pedaço de pão ou até um papel em chamas, não é muito animadora, chega a ser assustadora até. Mas imaginem como é ficar do lado de fora de um lugar onde estamos preparando e assando pães quentinhos...Não, a aula não é para todos os internos, e quem fica de fora não fica muito contente, como é de se imaginar.
Por outro lado, ao final de cada aula, são quinze garotos satisfeitos, se não com o aprendizado, com ter alguma coisa diferente para comer naquele dia. Se, entre todos, um ou dois resolver seguir a carreira de cozinheiro, que conquista terá sido! Acha impossível? Pois no final de uma aula na semana que passou, um deles, mirradinho, me chamou de canto e, sorrindo, confidenciou baixinho, para não ser ouvido pelos outros:
_Professor, quando eu sair daqui, vou parar de vender drogas e vou vender brioches!
Foi o dia em que ganhei o ano.
E foi então que me dei conta do que estava acontecendo ali. Não é preciso que nenhum deles venha a trabalhar em uma cozinha profissional, basta dar-lhes uma perspectiva nova de vida. E a cozinha pode oferecer-lhes isso. Fazer pães e salgadinhos pode proporcionar-lhes isso. É aí que o professor entra. Um professor, além de servir de exemplo, deve demonstrar respeito pelos seus alunos, sejam eles idosos, crianças, ricos, pobres. Deve fazer o que for preciso para, mais do que ser correto com eles, parecer correto. É o exemplo. É sua função. Miep Gies, guardiã do diário de Anne Frank (publicado em 1947), disse certa vez que todos nós somos pessoas comuns. Mas que todas as pessoas comuns podem – e devem – ser capazes de acender uma luzinha em uma sala escura. Nada mais correto.
Quantos professores eu tive que me fizeram pensar de maneiras diferentes, sem que para isso eu tenha seguido suas profissões. Lembro-me do professor Cássio, de matemática, que dava aulas na Escola Morumbi. Ele me apresentou ao livro “O Homem que Calculava”, de Malba Tahan. Foram duas descobertas: a leitura e a matemática, que pode sim ser interessante. E o que dizer do professor Mocelin, de história, em Curitiba, com seu jeito eloquente, meio doido mesmo. Floriano, professor de inglês, que aproveitava o fato das aulas serem dadas em um palco, para cem estudantes, e passava uma hora tocando clássicos ao violão, transformando em shows as aulas mais aguardadas pelos alunos. Não vou comentar sobre minha avó, que me deu aulas particulares de matemática quando eu realmente precisava, para não ficar emocional demais. E foram tantos outros professores...
Chega de me desviar do assunto, que, afinal, é gastronomia. Para aqueles que me pedem para postar mais receitas no blog (apesar da minha resistência, pois não gostaria que este se tornasse mais um blog de receitas...), vou então passar a receita que me fez ganhar o ano: brioches. Neste caso, recheados com goiabada.
Brioches podem doces ou salgados, e têm seu lugar na história da humanidade graças à Maria Antonieta, rainha da França pré-revolução, quando pronunciou a célebre frase “se o povo não tem pão, que comam brioches”. Com certeza não foi a melhor frase a ser dita, e o momento não poderia mais inadequado. Não acredito que ela tenha comido mais nenhum brioche nem dito mais alguma frase de efeito após a população revoltada ter separado, na guilhotina, sua cabeça de seu corpo. Ironicamente, o brioche clássico possui uma pequena “cabeça” no topo do bolinho, colocada separadamente do “corpo”. Se já eram feitos assim antes da revolução? Não sei...imagino que sim, prefiro pensar que não: seria uma justa “homenagem” à rainha.
Para fazer o brioche com recheio de goiabada, você vai precisar de:
· 100g de leite (gramas mesmo, pese na balança)
· 35g de fermento biológico fresco
· 200g de manteiga sem sal
· 250g de ovos (uns 5 ovos) + 1 ovo para pincelar
· 70g de açúcar
· 10g de sal
· 500g de farinha de trigo
· 200g de goiabada, picadinha
Misture o fermento com o açúcar em uma tigela e espere até ficar meio líquido. Coloque metade do leite e um pouco da farinha, mexa, formando uma massa meio pastosa, que deve ser coberta com filme plástico até aumentar de volume. Depois coloque o resto dos ingredientes e misture tudo. Quanto à farinha, melhor colocar aos poucos, sentindo a textura da massa. Se não precisar usar tudo, tudo bem. Se precisar de mais, coloque, mas com parcimônia...Faça bolinhas (devem dar umas 20: lembre-se de separar um pouco da massa para as “cabeças” dos brioches). Coloque a goiabada no centro de cada bolinha, faça novamente as bolinhas com o recheio dentro. Coloque as massas recheadas em forminhas – existem formas próprias, mas pode ser de empada -, e pressione com o dedo no centro de cada uma, fazendo um pequeno “furo”. Com a massa restante, faça bolinhas pequenas (as “cabeças”) e encaixe-as nos furos das bolas maiores (fotos 1 e 2). ATENÇÃO: cuidado com o recheio de goiabada quente, que queima como fogo na língua!