quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

LIÇÕES DE CIMA

No artigo de última página da última edição da revista Veja (edição 2202, 2 de fevereiro de 2011), do qual, aliás, peguei emprestado o título, J.R Guzzo discorre sobre como os maus exemplos de nossos políticos nas mais altas esferas da República refletem nas ações de nós, que estamos aqui “em baixo”. Como este é um blog sobre gastronomia, e não de política, vamos tratar sobre o exemplo do chef.
Em uma cozinha, o exemplo tem que vir do chef. Até pouco atrás, quando ainda não havia cursos universitários de gastronomia, a grande maioria (se não a totalidade) dos chefs tinha que percorrer um árduo caminho até alcançar o mais alto posto da hierarquia culinária: começava lavando pratos e panelas (ou mesmo na faxina), para depois atuar como ajudante de cozinha (fazendo toda a preparação para os cozinheiros, como os cortes, a higienização dos alimentos, etc.). Se demonstrasse capacidade e vontade, era escalado para cobrir as folgas de um cozinheiro, passando pelos diversos setores da cozinha: garde manger, açougue, confeitaria, etc., até ser chamado para pilotar os fogões de fato. Depois de anos poderia se tornar um chef, com um real conhecimento de como funciona todos os departamentos daquela cozinha. Esse longo percurso o capacitava para exercer a função.

O bom chef sabe como é difícil a tarefa do lavador de pratos, sabe como é minucioso o trabalho do ajudante de cozinha, sabe da importância de cada um daqueles que formam sua equipe. O bom chef não tem preguiça de arregaçar as mangas e se enfiar dentro de uma câmara fria (não raro abaixo de zero grau centígrados) para conferir se a limpeza está sendo feita corretamente e, se não estiver, ensinar a pessoa responsável a fazer o serviço direito. O exemplo, também na cozinha, vem de cima. Um cozinheiro não vai respeitar o chef que chega tarde, passa as horas dentro de uma salinha em frente ao computador, dá umas voltas pelo salão cumprimentando os clientes e depois sai mais cedo que os demais, com seu uniforme impecável e limpinho. E que ainda tem coragem de gritar exaltado quando percebe (veja bem: quando percebe) um serviço mal executado.
O bom chef se preocupa em saber se sua equipe está motivada, se algum problema externo está influindo no bom andamento de sua cozinha ou se problemas internos (fofocas são insuportáveis) poderão vir a ser um estorvo em sua vida. O bom chef faz escalas de serviço respeitando a vida pessoal de cada um. O bom chef se informa, pesquisa, estuda sempre novos ingredientes e maneiras de preparo. O bom chef sabe ouvir críticas e sabe criticar sem ser injusto, sabe que, às vezes, alguma coisa dá errado mesmo, e o melhor a fazer é reconhecer o erro, corrigi-lo e aprimorar-se para não mais cometê-lo. O bom chef dá o exemplo correto, é o modelo a ser seguido.
Ser o chef de uma cozinha profissional não é tarefa fácil. E ser um bom chef, respeitado e admirado não apenas pelos comensais, mas principalmente entre seus colegas e subordinados, é tarefa hercúlea. Hoje, depois de apenas dois anos em uma faculdade, o aluno já acha que pode exercer a função de chef sem maiores complicações. A faculdade nos ensina muitas coisas, mas a prática do dia-a-dia é insubstituível. E é essa prática que vai fornecer conhecimento suficiente para tornar um chef um bom exemplo de profissional. Então, se você já é ou pretende ser um chef de cozinha, almeje também ser um bom exemplo a ser seguido, concilie seus desejos e atitudes profissionais com ética, respeito e humildade. E pratique. Muito.

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