domingo, 29 de maio de 2011

A NOVÍSSIMA GERAÇÃO

No último dia 26 de maio, estive presente em um daqueles eventos que valem toda uma história para contar. O Restaurante Barbaresco do Vale Sul Shopping recebeu em suas instalações alguns chefs de cozinha para uma premiação de um concurso em que minha esposa, entre outros chefs convidados, foi jurada. Outro chef convidado para a ocasião foi o chef Marco Antônio, antigo cliente de minha lanchonete em Campos do Jordão e que, anos depois, foi meu professor na faculdade de gastronomia. Que mundo enorme, não? Encontrá-lo no evento foi mais um motivo de satisfação. As categorias eram três: melhor salgado, melhor doce e melhor “festa”.
A Chef Lili, jurada do concurso
Até aí nada de novo, afinal são vários os concursos culinários hoje em dia (ainda bem, porque eu adoro e até já participei de um – não, não ganhei, mas cheguei na final...) e minha esposa, permitam-me dizer, já foi jurada de muitos deles, inclusive da edição especial Comer & Beber da Revista Veja. Portanto, poderia ser mais uma daquelas noites com grandes chefs, muito deles com o ego nas alturas e um belo jantar no final. Tudo isso, realmente, esteve presente: grandes chefs, egos inflados e um delicioso jantar no final. Mas algo foi diferente, muito diferente do que costumam ser essas noites...Quer saber qual foi a diferença?
O local do evento, Restaurante Barbaresco Vale Sul Shopping
Chef Lili e chef Marco Antônio
Uma dica: os patrocinadores do concurso eram, além do próprio do Restaurante Barbaresco, uma loja de brinquedos chamada Chic Toys. Já deu prá sacar, né? Ainda não?!? O nome do concurso era “Mini Chef”. Agora você sacou, não? Pois é: os participantes eram crianças de 4 a 12 anos, e lá estavam os três mini-vencedores, cada qual em sua categoria. E, claro, seus familiares, possuidores dos tais “egos inflados” citados anteriormente. Vamos dar nomes aos “Mini Chefs” consagrados: na categoria “melhor festa”, ganhou Eduarda Morita, com seu inusitado “Caracol Colorido” (pão de forma com pasta de beterraba, alface e maionese, enrolados como rocambole, cortados e espetados no palito). Na categoria “melhor salgado”, o vencedor foi Maurício de Andrade e Silva Maganha, com o saudável “Espaguete Vegetariano à Mauricio” (espaguete com um molho muito semelhante ao putanesca, porém sem o aliche, e sem o nome comprometedor...). Finalmente, abocanhando o prêmio na categoria “Melhor Doce”, João Pedro Osses Sala, com o delicioso “Muffin de Banana”.
O início do evento, cheio de espectativas
A criançada, cozinhando e se divertindo
Cada "Mini-Chef" explicou, quase direitinho, sua receita...
Foi uma noite divertidíssima e, porque não dizer, “fofa”. Os pequenos chefs ganharam, entre outros prêmios, aventais e chapéus de cozinheiro, e apresentaram suas receitas em meio a um tiroteio de flashes (entre eles, o da minha máquina), dando ao evento ares da importância que ele realmente merecia. Entre jornalistas, parentes, patrocinadores e “Big Chefs”, a criançada se divertiu a valer.
Reparem no "Mini-Chef" abocanhando seu muffin...descontração deliciosa!
Não dá para dizer ao certo que as receitas eram criação dos eleitos “Mini Chefs” (na verdade, acho difícil que não tenha havido uma “forcinha” das mamães e dos papais), mas achei a iniciativa sensacional. Criar o gosto pela gastronomia desde bem pequeno é importante, ainda mais se valorizarmos (como foi o caso) o aspecto saudável da comida. Fico imaginando essas três crianças vencedoras em seus colégios, na hora do recreio:
_Você quer comer um hambúrguer na cantina? – pergunta o amiguinho.
_Não, vou comer o espaguete vegetariano que eu mesmo fiz!! Se você quiser eu te ensino...- responde o “Mini Chef”, orgulhoso.
_Vamos comer uma bolacha recheada?
_Prá quê?!? Eu trouxe meu próprio muffin de banana, quer provar?
_Quer um pedaço de coxinha frita?
_Eu não!! Eu tenho esse delicioso “caracol colorido”, que trouxe de casa. Muito mais gostoso e saudável! Não conhece?
_Não!
_Claro, fui eu que inventei!
Sabe como são as crianças...
Parabéns aos organizadores pelo evento, pela iniciativa e pelo sucesso alcançado. Eu me diverti bastante, mais até do que naquelas noites de gala, cheias de pompa e, às vezes, entediantes. Fica a proposta: se você tem crianças em casa, tente criar nelas esse costume de cozinhar sua própria comida, escolhendo ingredientes saudáveis e apetitosos, fazendo experiências culinárias, conhecendo novos sabores. Quem sabe não está aí, bem ao seu lado, um futuro grande chef? Não precisa nem chegar a tanto, qualquer esforço nesse sentido já terá valido a pena!
       No meu tempo de criança, minha mãe dizia que as mulheres admiravam homens que sabiam dançar, e eu fiz aulas de dança de salão. Hoje, é inegável o charme que desperta nas mulheres um homem que saiba cozinhar...ou será que estou enganado esse tempo todo?!? Quem sabe é por aí que você consiga convencer seu filho a passar um tempinho na cozinha? Se, por outro lado, você tiver uma filha em casa, nem preciso dizer que, ainda hoje, vocês mulheres nos conquistam – também – pelo estômago. Mãos à obra, fornos e fogões ligados, produtos à mesa, ação!! Mas lembre-se: para criança cozinhar, todo cuidado é pouco, e SEMPRE deve haver um adulto por perto, certo?

segunda-feira, 23 de maio de 2011

PRODUTOS LOCAIS

      Utilizar ingredientes locais na gastronomia é, definitivamente, uma tendência mundial. Essa nova atitude tem uma série de razões, econômicas, qualitativas e ambientais. Economicamente, é claro que utilizar produtos e ingredientes que foram plantados e colhidos (ou criados) em locais próximos (às vezes, nem tão próximos assim...) custa menos e, portanto, o lucro é maior. Usando produtos locais, o frescor dos alimentos fica evidente nas preparações, resultando em um prato com qualidade insuperável. Ecologicamente, a utilização desses produtos agride menos o meio-ambiente, pois reduz os danos causados pelo transporte e o custo ambiental cai consideravelmente.
Em Roma, faça como os romanos. Em Parma, peça o presunto local...delicioso!
Isso sem falar no grande barato que é provar produtos locais. Em minhas viagens (que não são muitas, infelizmente) procuro sempre saber qual o ingrediente local, o orgulho da região. Quando passava minhas férias em Balneário Camboriú, Santa Catarina, nos distantes anos 80, eu adorava acordar cedo e escolher os peixes ali, na praia, logo que os pescadores punham os pés na areia. Produto mais fresco, impossível. Lembro-me de nadar até uma pequena ilha (agora sei seu nome: Ilha das Cabras) e, lá chegando, observar uma fileira de tubarões expostos sobre uma pedra. Eram cações, que na época eu já adorava comer, sem saber, contudo, a melhor maneira de prepará-los. Mas que surpresa vê-los ali, enfileirados na pedra e quase vivos. Na verdade, alguns ainda se debatiam, transmitido ao mesmo tempo uma sensação de tristeza ao vê-los à espera do fim inevitável e uma sensação de vida, de respeito ao saber que eles eram o ganha-pão (seria ganha-peixe?!?) daquela pequena comunidade.
A Ilha das Cabras, em Balneário Camboriú, SC.
Outra vista da ilha, com a praia e a cidade ao fundo
_Onde o senhor pescou esses tubarões? – perguntei ao velho pescador que expunha, com orgulho, o resultado de seu trabalho.
_Aí mesmo, no mar! – Fiquei com cara de otário, claro. Onde mais ele poderia ter pescado os tubarões?!?
Um cação, em seu habitat...não são tão grandes, mas são tubarões...
Olhei para o mar, em cujas águas eu acabara de nadar para alcançar a ilha, e um calafrio percorreu minha espinha. Eu não voltaria nadando até a praia, de jeito nenhum! Fiquei ali jogando conversa fora com o pescador (uma figura fantástica!), disfarçando meu receio de cair naquelas águas novamente. Fiquei sentado nas pedras, e algum tempo depois sua mulher chegou com um delicioso prato de postas de cação com pimentões vermelhos. Comemos com as mãos, um contando histórias para o outro, muitas das quais desconfio que eram legítimas histórias de pescador. Sem problemas, foi uma tarde fantástica! Aliás, um problema: o problema era que a noite não tardaria a chegar, e eu ainda tinha um mar repleto de tubarões para enfrentar até chegar à praia de Camboriú. Nadar de volta, nem pensar. Quando já estava quase pedindo ao meu novo amigo uma carona em sua “voadeira” (aquelas estreitas canoas motorizadas), eis que chega meu salvador. Aliás, salvadores.
Postas de cação são deliciosas!

Um casal paulista com sua filha acabava de chegar em um pedalinho, onde cabiam quatro pessoas. Eles estavam em três, então logo tratei de puxar uma conversa e conquistar uma vaga no “Pedalinho da Salvação”. Depois de mais uma porção de cação regada a cerveja beeem gelada, mais histórias de pescador contadas, voltamos (de pedalinho, claro) à praia da qual eu havia partido. Não revelei ao casal e à sua filha o porquê de eu solicitar a carona, afinal minha recente fama de “corajoso-nadador-do-mar-cheio-de-tubarões” me garantiu a comida daquela tarde...depois de comer tanto e tomar algumas cervejas, vocês sabem, não devemos entrar na água. Desculpa perfeita!
Um pedalinho semelhante ao "Pedalinho da Salvação". Salvo, afinal!
 Voltei algumas vezes àquela ilha, sempre de caiaque ou pedalinho, e sempre voltei de lá com cações deliciosos para o jantar. Impossível ser mais ecológico e econômico, já que o pescador fazia questão de me dar alguns peixes além do preço pago pelo tubarão. Faça isso você também (não, não estou querendo que você vire comida de tubarão): em cada viagem, procure conhecer os sabores locais, produtos e ingredientes ali plantados, os animais criados com fins culinários. Mais do que isso, faça amizades com o povo da terra. Amigos são o alimento da alma, renovam nossa vontade de existir. Afinal, de que serviria um perfeito e grandioso banquete sem os seus amigos ao redor da mesa?
Um pescador em sua "voadeira", em Camboriú: peixes mais baratos e saborosos
       Procure usar ingredientes locais em suas preparações, você vai se divertir e ajudar pessoas da comunidade, que são, quase sempre, simples e interessantes. Se você for cozinhar utilizando produtos de sua região, me chame. Se for cair num mar com tubarões, me desculpe, mas dispenso o convite...não devemos dar sopa ao azar, já dizia minha avó...Abraços a todos!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

COMEMORAÇÕES ATRASADAS

Vida de cozinheiro é assim mesmo: comemorações são celebradas com atraso, principalmente em datas concorridas em restaurantes, como foi o recente Dia das Mães. Eu estava de folga no domingo e pude levar a minha mãe ao restaurante onde minha mulher é a chef de cozinha, mas uma mãe ficou faltando: minha sogra. Somente nesta terça-feira, dia 17 de maio, é que coincidiram as folgas minha e da minha esposa. Portanto, com quase dez dias de atraso, lá fomos nós para São Paulo para o grande “Almoço de Dia das Mães” com minha segunda família. Presentes estávamos eu, minha mulher, dona Lourdes, tia Dete e tia Nenê.
Tia Nenê e tia Dete preparando-se para o "ataque"...
Grande ocasião para degustarmos aqueles pratos que já se tornaram clássicos: o arroz de forno da Lourdes (minha sogra) e a carne recheada da Tia Dete. Além de serem deliciosos, têm aquele sabor especial de reunião familiar e, melhor, não foram feitos nem por mim nem por minha mulher! Afinal, dia de folga de cozinheiro ou é dia de churrasco, ou de pizza. Sabe como é: em casa de ferreiro...Ou, como foi o caso, é dia de algum amigo ou parente cozinhar para todos nós. Que delícia!
O almoço de Dia das Mães, um pouco atrasado...
Dona Lourdes conta que já prepara seu arroz de forno há mais de 20 anos. O arroz é cozido normalmente, depois reservado. Alguns ingredientes são misturados a este arroz: presunto (bem picadinho), palmito, ervilha, milho e queijo tipo mussarela. Para dar uma cor especial, extrato de tomate. Tudo misturado, é hora de colocar o arroz em uma travessa de vidro com uma camada de queijo mussarela por cima. Leve ao forno até o queijo ficar daquele jeito irresistível, quase que como uma casquinha, dourada e deliciosa. Prontinho. O sucesso é garantido.
Dona Lourdes e o arroz de forno. Olha a casquinha de queijo por cima...
O arroz de forno, ainda intacto.
Poucos segundos depois...
Tia Dete (Odete, para os não tão íntimos) também prepara seu prato principal há mais de 20 anos. Na véspera de comemorar seu 80º aniversário, continua muito animada e, quando nos visita aqui em casa, é ela quem fica na percussão enquanto eu brinco com o violão. Sua animação nestes dias de música é tão grande que a família já a chama de “Syang”, a roqueira. Tia Dete tempera a peça de lagarto um dia antes, com sal, pimenta e muito, mas muito alho. O recheio leva bacon, calabresa, azeitonas pretas, cebola, salsinha e mais alho. Nada contra, pois sou apaixonado por alho (ainda bem...). A carne é feita na panela de pressão, e fica maravilhosa! Deve ser o ingrediente “amor”, usado sem parcimônia, pois é impressionante como algo tão simples pode ficar tão delicioso e irresistível à mesa. Eu, que não sou de repetir pratos (na verdade, nunca fui um “bom garfo”. Prefiro cozinhar à comer), sempre como dois ou três pratos da “Carne da tia Dete”. Para acompanhar, batatas igualmente irresistíveis. Perfeito!
Tia Dete, e a famosa "Carne da Tia Dete". Delícia!
"Carne da Tia Dete" com batatas. Como resistir?!?
Quando achei que tudo havia terminado, já de barriga estufada, o sono chegando, a surpresa: sobremesa! E a sobremesa que eu mais adoro (aliás, um dos poucos doces que eu realmente gosto): pudim. ADORO pudim, principalmente com bastante calda, daquelas que “bebemos” o finalzinho com a colher. Ou simplesmente viramos o prato na boca e sorvemos toda a calda que não foi possível comer com o doce...mas, na casa da sogra, precisamos ter modos, vocês sabem como é...
Finalmente, mesmo com o atraso de mais de uma semana, tivemos um excelente almoço de Dia das Mães. E, como já estou atrasado mesmo, lá vai: para todas as mamães, meus parabéns! E minha gratidão especial à minha mãe (claro, pois eu não teria como estar aqui sem sua “pequena” ajuda e por todo amor e compreensão nesses quase 40 anos) e à minha sogra (que também teve “participação fundamental” para que eu pudesse conhecer alguém tão sensacional como minha esposa).

sexta-feira, 13 de maio de 2011

13 DE MAIO - DIA DO GASTRÔNOMO

Hoje é sexta-feira 13. Você é supersticioso (a)? Eu? Bom, eu não creo en las brujas, pero que las hay...No meu trabalho, pelo menos 8 das 11 funcionárias entraram com o pé direito e se benzeram antes de começarmos o dia de labuta. Ótimo, porque tudo correu bem e trabalhamos bastante. Foi mais uma daquelas sextas-feiras agitadas em uma praça de alimentação de um shopping center. Se você já foi numa sexta, na hora do almoço, em uma praça de alimentação de qualquer shopping center, sabe do que estou falando.
Foi um dia bom também porque revi um colega de faculdade, e tive a oportunidade de receber (e devolver) os parabéns pelo Dia do Gastrônomo. Nunca gostei deste título:”gastrônomo”. Quando alguém lê no meu cartão a palavra “gastrônomo”, quase me chama de Doutor Eduardo, imaginando que eu deva ser um médico especializado nos males do estômago ou algo parecido. Logo me antecipo e corrijo: sou COZINHEIRO. Falando nisso, outra coisa que não estou suportando é ver alguns de meus ex-colegas (e alguns que ainda nem se formaram) se auto-intitulando “Chefs”. Ora, ser um Chef é apenas um estágio da profissão de COZINHEIRO, que, isto sim, somos todos nós.
Aí você pode me repreender:
_Mas o seu blog chama-se Chame o Chef!
Chama mesmo, mas é uma “questão de ouvido”. Imaginem o blog “Chame o Gastrônomo!”. Parece ou não um blog de um profissional da saúde, aristocrático, chato, cheio de fleumas e dogmas? Socorro!! Estou passando mal, chama o gastrônomo!! É também uma homenagem ao livro “Chame o Chef” (já citado por mim em outras oportunidades neste blog), de Luciana Fróes, editora Ediouro. São pequenas histórias de apuros em que grandes Chefs (estes sim, Chefs, com letra maiúscula e todo o respeito que merecem) se meteram, e de como conseguiram (alguns) se safar. Leitura rápida, fácil, interessante e divertida. E no livro, vejam só, ninguém é chamado de “gastrônomo”.
Mas, se ficou estabelecido o título, e ainda ganhamos um dia para chamar de nosso, então está tudo bem. Você ligou para seu amigo gastrônomo para desejar-lhe os parabéns? Claro que não. Esse é mais um daqueles dias que só quem exerce a profissão sabe que dia é. Ou você sabe me dizer qual o dia do padeiro, do médico, do dentista, do lixeiro ou do limpador de janelas? Ou o dia do livro, do amigo, do circo? O dia da pizza eu sei, é o dia do meu aniversário (juro!). E o dia do consumidor (!!) eu também sei, é o dia do aniversário de minha mulher. É verdade, por incrível que pareça...
Então, amigos chefs, cozinheiros profissionais, ajudantes de cozinha, cozinheiros amadores de fim de semana, apaixonados por gastronomia e, vá lá, gastrônomos, meus parabéns! Qualquer que seja o nome da profissão (há quem chame de “gastrólogo”, o que eu acho ainda mais esquisito), tenho muito orgulho de exercê-la. E só quem já preparou uma comida seguida de elogios sabe como é gostosa essa sensação...Nesta sexta-feira 13, comemoremos e façamos um brinde aos profissionais que trabalham (muito) nos momentos em que todos estão se divertindo. Saúde!! E que tenhamos todos um excelente sábado 14, domingo 15, e assim por diante...

domingo, 8 de maio de 2011

CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO E A GASTRONOMIA DE CAMPOS DO JORDÃO

Aparentemente, o título deste texto soa como algo irreal, non sense e até apelativo: afinal, o que teriam em comum campos de concentração com a gastronomia de Campos do Jordão? Muita coisa. Mas não me refiro aos temidos e cruéis campos de concentração nazistas alemães, e sim brasileiros(?!?), nas cidades de Pindamonhangaba e Guaratinguetá. Ficou ainda mais confuso? Calma, vou explicar.
 
Prisioneiros de um Campo de Concentação de Prisioneiros no Brasil
         A colonização alemã em Campos do Jordão tem uma história curiosa: no ano de 1939, o Windhuk, um navio cinco estrelas alemão carregado de turistas abastados que faziam safáris pelas colônias européias na África, foi pego de surpresa com o início da Segunda Guerra Mundial. Ele estava ancorado na Cidade do Cabo, África do Sul, com 250 tripulantes e 400 passageiros. Certa madrugada, clandestinamente, com as luzes apagadas e com as cores da bandeira japonesa (o Japão ainda não havia se envolvido no conflito) costurada sobre a bandeira alemã, o Windhuk partiu em direção ao Atlântico, chegando até onde seu combustível permitia e em um local até então neutro na guerra: Santos, Brasil. Mesmo o Brasil se mantendo neutro à guerra, até então, os tripulantes alemães foram impedidos de pisar no país, passando a viver no navio. Com o rompimento de relações entre Brasil e Alemanha em 1942, foram confinados em Campos de Concentração de Prisioneiros nas cidades de Pindamonhangaba e Guaratinguetá, onde permaneceram até o fim da guerra (1945). A partir de 1942, aproximadamente 3.000 pessoas de origem alemã, italiana e japonesa foram encarceradas em campos de concentração criados em sete Estados brasileiros (PA, PE, RJ, MG, SP, SC e RS).
Oficiais do navio Windhuk
Que fique registrado que em nada se comparavam aos campos de concentração nazistas: os espaços de confinamento brasileiros permitiam que os prisioneiros saíssem para fazer compras na cidade, receber visitas e até tocar em festas. Aqui, os soldados do Campo de Pindamonhangaba tomavam caipirinha com os prisioneiros. “O melhor campo de concentração do mundo”, segundo relatos dos próprios prisioneiros alemães.
Pois foram estes tripulantes que, ao término da guerra e ao subir a Serra da Mantiqueira, formaram a primeira leva de profissionais no ramo da hotelaria e gastronomia em Campos do Jordão. Hotéis como o Toriba e o Grande Hotel contavam com cozinheiros, garçons, cabeleireiros e músicos das orquestras do Windhuk.
O Windhuk, "berço" da gastronomia de Campos do Jordão
A imigração japonesa também marca forte presença na cidade e tem como um de seus símbolos a “Festa da Cerejeira em Flor”, comemoração tradicional no Japão e desde 1968 presente no calendário jordanense. A festa é ótima, mas um pouco ocidentalizada: vende de yakissobas a hambúrgueres e pastéis. Mas o palco é dos japoneses, com aqueles instrumentos exóticos (para nós, ao menos), tambores gigantes, vozes femininas cantando num agudo quase irritante palavras que nunca saberei o que significam. Enfim, imperdível!
No mês de agosto,as cerejeiras florescem: tempo de festa em Campos do Jordão
Do sul do estado de Minas Gerais veio a maioria dos antigos moradores da região, e ainda hoje muitos moradores são provenientes de cidades como Paraisópolis, Itajubá, Pouso Alegre, Gonçalves, Varginha e Candelária. Gente boa, uai.
Da mistura destes povos e culturas, surgiu a gastronomia de Campos do Jordão, simples (voltada aos moradores da cidade) e sofisticada (destinada aos turistas e moradores mais abastados). Cabe aqui uma triste constatação, quase uma crítica social: a discrepância de renda entre os moradores do município com a dos seus visitantes. Morei em Campos do Jordão por quatro anos, e o que vi foi um povo miserável, com poucas opções e alternativas de vida, morando em barracos de madeira em áreas de risco. Vi também o outro lado: por seis meses trabalhando e estudando no Grande Hotel SENAC, vi pratos magníficos serem servidos a milionários famosos e anônimos, vi playboys e patricinhas desfilando em Ferraris vermelhas, vi a linda arquitetura dos hotéis e casas de campo, enfim, tudo aquilo pelo qual a cidade é conhecida (num excelente golpe de marketing) como a “Suíça Brasileira”. Mas será que os pobres daqui são como os pobres de lá? Sei não...
O Grande Hotel SENAC de Campos do Jordão. Impecável.
O Home Green Home Hotel. Maravilhoso.
Casa típica dos jordanenses: esta, felizmente, não está em área de risco.
Entretanto, uma coisa é inegável: em Campos do Jordão come-se (e paga-se) muito bem. Restaurantes internacionais de diversas origens (alemães, franceses, suíços, portugueses, japoneses, etc.), excelentes fondues (de tudo o que você pode imaginar: queijo, carne, chocolate, carnes exóticas, frutos do mar), um serviço impecável (graças também a escolas como o SENAC, que foi o precursor e consagrou a excelência do serviço na cidade), restaurantes e hotéis  maravilhosos.
Pergunte a qualquer turista qual o prato típico de Campos do Jordão, e ele responderá: o fondue. O fondue, claro, não foi criado na cidade, nem tão pouco faz parte dos hábitos culinários de seus moradores, mas sua identificação com o município é tão grande que precisa ser registrado. O prato original, suíço, surgiu como sendo a mistura de diversos queijos fundidos (daí o nome fondue). Nada mais natural, então, que na “Suíça Brasileira” o fondue tornasse-se também um clássico. Em Campos do Jordão, são oferecidas diversas opções, existindo inclusive restaurantes que oferecem rodízio de fondues.
O fondue do Restaurante Só Queijo: você PRECISA provar...
O fondue não é a única influência suíça na gastronomia da cidade. O chocolate fabricado na cidade ganhou fama a partir dos anos 70. Ele é consumido em sua maioria pelos turistas, e é encontrado na forma de tabletes, trufas, ramas, bombons, sólidos e líquidos (chocolate quente). Ao final da tarde, quando o sol já não aquece as faces vermelhas, é comum encontrarmos centenas de turistas de gorro e luvas deliciando-se com um copo de chocolate bem quente entre os dedos. Uma delícia, apesar de bastante caro.
Chocolates artesanais: tradição jordanense
A gastronomia alemã, trazida pelos imigrantes, também se faz presente. Joelho de porco, repolho, salsichões e doces típicos alemães podem ser encontrados sem dificuldade. O mais badalado restaurante da cidade é especializado neste tipo de gastronomia: o Baden Baden, que aproveitando-se da ótima qualidade da água da montanha, também fabrica sua própria cerveja, distribuída nacionalmente e com boa reputação no mercado (na fábrica da cervejaria, localizada na cidade, você pode ver a cerveja sendo fabricada e, com moderação, pode provar o produto final ali mesmo!).
Mesinhas na calçada do Baden Baden: point no bairro Capivari
Enfim, o pinhão. Indiscutivelmente, o modo mais tradicional de consumo do pinhão é o de cozinhá-lo em uma panela de pressão por pelo menos quarenta minutos, descascá-lo e comê-lo com sal. Tropeiros comiam o pinhão jogando-os na fogueira. Hoje, nos restaurantes, o fruto da araucária é consumido na forma de doces, farofas, molhos, recheios de carnes, recheio de massas, assados, cozidos ou fritos. O bolo de pinhão das quituteiras jordanenses já pode ser considerado um clássico.
Truta recheada com pinhão
Posta de robalo com crosta de pinhão
Paçoca de pinhão com carne seca e purê de banana
Torta doce de pinhão
Pinhão: eu gosto, tu gostas, todo mundo adora!
Algumas dicas: o Restaurante Araucária, do Grande Hotel Senac, de cozinha internacional, e o Restaurante Só Queijo (que não serve apenas queijo, mas serve o melhor fondue de queijo que você jamais sonhou). Nestes locais, você também encontra uma extensa e perfeita carta de vinhos, para qualquer ocasião. Vá também ao Baden Baden, o lugar mais badalado do Capivari (bairro onde tudo acontece em Campos), especializado em culinária alemã. Conheça a Fábrica de Chocolates Araucária, onde você pode acompanhar a fabricação do produto.
N.B. (Nota do Blogueiro): este blog não tem nenhum vínculo, de qualquer espécie, com qualquer estabelecimento comercial. Os locais aqui citados são apenas sugestões deste blogueiro...

segunda-feira, 2 de maio de 2011

AMIGOS, APOSTAS E QUEIJOS

Há cerca de um mês comecei a trabalhar em um restaurante aqui de São José dos Campos, uma grande oportunidade profissional e um local cheio de doidos, como em TODOS os restaurantes que conheci. Na realidade são dois restaurantes juntos, em um shopping center, e eu, logo eu, que nunca fui fã do ambiente “shopping center”, agora fico ali, bem na praça de alimentação. É também um local cheio de gente bacana, e algumas amizades já se iniciaram. Nesta última quarta-feira, Denis, um dos doidos, ops, um dos colegas de trabalho, veio nos fazer uma visita em casa, em plena noite de jogo São Paulo versus Goiás pela Copa do Brasil.
Não, ele não é torcedor do Goiás, mas também não é torcedor do São Paulo, o que, logicamente, o transformou, naquele momento, no torcedor mais antigo e fanático do alviverde goiano. Bom, eu sou torcedor do tricolor paulista, e uma aposta me foi proposta: uma caixa de cerveja deveria ser paga para aquele cujo time vencesse a partida. Aposta proposta, aposta aceita...aposta ganha. Eu havia pedido uma pizza antes deste amigo chegar e, obviamente, nos sentamos todos à mesa para devorar esta iguaria que, aliás, tem no dia do meu aniversário o seu dia. Pois é: dia 10 de julho, meu aniversário, é o dia da pizza.
10 de julho: dia mundial da pizza. Parabéns para mim!
Tudo isso para dizer que, ao servir a linda e apetitosa pizza margheritta ao futuro perdedor da aposta (o jogo ainda não começado), uma pequena observação foi feita por ele: “não gosto de queijo”. NÃO GOSTA DE QUEIJO?!? Não se trata de intolerância à lactose, como é o caso de um outro amigo meu, mas sim de, simplesmente, gosto. É como diz a sabedoria popular: gosto não se discute, apenas se lamenta. E eu lamento mesmo, pois sou um admirador dos mais diversos tipos de queijo, das mais variadas consistências, cores, sabores, procedências. Imagino que a noite não deva ter sido muito agradável ao nosso convidado: primeiro, o queijo, depois a aposta (por ele proposta) perdida.
Apostas: nem sempre o resultado é o esperado...
Quem não gosta de queijo não sabe a delícia que é comer um fondue nos dias frios (o fondue original é o de queijo, todas as demais variações, que também adoro, vieram depois), o sabor da casquinha crocante do queijo coalho feito na grelha no churrasco de domingo, a excelência do queijo parmesão ralado na hora por sobre uma massa al dente ou polvilhado sobre um carpaccio de carne.  Também não pode degustar aquele misto-quente na padaria, devorar um couvert de pastéis de queijo nos restaurantes ou uma deliciosa abobrinha gratinada. E o que dizer de uma porção de provolone à milanesa acompanhada de uma cerveja bem gelada? Mas, gosto realmente não se discute... 
Fondue de queijo: requinte delicioso!
Provolone à milanesa: delícia de botecos do Brasil. Dá prá não gostar?!?
Muitos fatores são importantes para a produção de um queijo de qualidade, com aroma marcante, textura correta e sabor impecável. Entre estes fatores, destaco: o tipo de leite (de vaca, de cabra, de ovelha), a raça do animal, o tipo de pastagem deste animal, a maneira de armazenagem e maturação. Maneiras diferentes de fabricar o queijo são encontradas em diversos países. Se aqui no Brasil o costume é servir o queijo antes da refeição, quase que como um aperitivo, na França ele é servido depois do prato principal e antes da sobremesa.
Aqui novamente entra a questão do gosto, afinal existem paladares diferentes. Existem também ocasiões diferentes, e cada qual combina melhor com determinado tipo de queijo. Queijos suaves, queijos mais fortes, salgados, acres, picantes, macios ou duros, cada um destes tipos vai bem em determinadas ocasiões. Sendo a oferta de queijos tão ampla, a maneira de consumi-los também o é. Coma queijos com pães, bolachas ou frutas. Ou faça uma linda tábua de queijos (atenção: não caia na tentação de decorar a tábua como se fosse uma réplica de um chapéu de Carmem Miranda). Sirva um bom vinho (branco ou tinto, dependendo do queijo) que realce o sabor do alimento. Faça pratos deliciosos, como um simples filé à parmegiana, ou um pouco mais elaborados, como um medalhão de filé mignon ao molho de gorgonzola (acompanhado de um risoto de funghi...hummm...).
Vou listar aqui alguns queijos que você pode servir aos seus amigos e familiares e surpreendê-los com uma linda tábua de queijos. Algumas dicas: não coloque mais do que quatro ou cinco tipos de queijo, porque os aromas e sabores se perderão no ar e nas papilas gustativas dos seus convidados. Deixe um pedaço dos queijos sem cortar, com algumas partes já cortadas (pode ser em cubos pequenos) e com uma faquinha para cada queijo (melhor se for própria para queijos). Pão italiano é quase sempre uma aposta certeira como acompanhamento. Decore com frutas secas e/ou uvas, mas cuidado com o exagero. E retire os queijos da geladeira cerca de uma hora e meia antes de servi-los. Alguns queijos você pode encontrar em mercados e casas especializadas, outros podem ser mais difíceis de encontrar, mas vale a procura:
·         Brie
·         Camembert
·         Boursin (simples –mais suave- ou com alho, com ervas ou pimentas)
·         Brillat-Savarin
·         Esrom
·         Reblochon
·         Blue Cheshire
·         Gorgonzola
·         Fourme D’Ambert

·         Roquefort
·         Stilton
·         Edam
·         Gouda
·         Emmental

·         Gruyère
·         Banon
·         Montrachet (pode ser com ervas)
·         Pecorino Romano (pode ser o Pecorino Siciliano)
·         Tomme Au Noix
       Achou a lista longa? Acredite, existem centenas (serão milhares?) de outros tipos, alguns tão únicos em suas qualidades e propriedades (como o Serra da Estrela, de Portugal) que daria para escrever um livro. Ou dois. Ou mais. Destes que listei, cada um tem uma particularidade interessante e marcante (renderiam outro texto), que você não se arrependerá de comprar e saborear. Eu sei, alguns são mais caros, mas você não vai servir uma tábua de queijos todos os dias. Ou vai? Quando for, me chame! Chame o Chef!! Abraços a todos, um beijo e um queijo.