domingo, 5 de junho de 2011

REFEIÇÕES TEMÁTICAS

No final do ano 2000, quando finalmente decidi sair de São Paulo em direção a Campos do Jordão para aprender a (realmente) cozinhar, não fazia muita idéia do que me aguardava na pequena e gelada cidade da Serra da Mantiqueira. Foi neste ano em que fechamos a pastelaria na Rua Teodoro Sampaio, que, se em muito me acrescentou em amizades e experiências de vida, em quase nada somou aos meus conhecimentos gastronômicos. Em grande parte por minha culpa mesmo, que não imaginava em seguir essa profissão, mas também por se tratar de uma franquia na qual todos os produtos – massa de pastel, massa de pizza, recheios de carne, frango, bacalhau, etc. – já chegavam prontos, vindos de uma cozinha central que distribuía tudo aos franqueados. Nosso trabalho era vendê-los de maneira eficiente.
Em abril do ano seguinte, 2001, já tendo sido aceito no curso de Cozinheiro Básico do Grande Hotel SENAC, lembro-me da viagem até Campos, numa tarde linda e quente, com um céu tão azul que eu não podia acreditar que a cidade para a qual eu estava me mudando tinha fama de fria (muito, mas muito fria mesmo) e chuvosa. Com sorte eu poderia ver, vejam só, neve! Uma passagem desta viagem me marcou particularmente. Ao atravessar o túnel próximo ao acesso a Santo Antônio do Pinhal, já próximo do ponto mais alto da Serra, olhei para a imensidão do Vale do Paraíba lá embaixo e, um pouco acima das montanhas, mas ainda abaixo de onde eu estava, dois nítidos, enormes e magníficos arco-íris, um sobre o outro, pareciam anunciar que eu veria, a partir daquele momento, algumas coisas que nunca havia visto até então. Seriam dois potes de ouro a me esperar na nova cidade? (Realmente foram: uma esposa maravilhosa e uma profissão desafiadora!) Lembro-me de rir sozinho no carro, num misto de felicidade e a apreensão de chegar em um lugar novo para fazer algo também novo com pessoas desconhecidas.


Vista da Rodovia Floriano Rodrigues Pinheiros,lá em cima, quase em Campos do Jordão
 
Dois arco-íris. Serão dois potes de ouro?!?
E assim foi. Logo na primeira semana no interior do hotel 5 estrelas, novos cenários se desvendaram, não apenas na gastronomia propriamente dita, mas também na maneira de apresentá-la. Eu não fazia idéia de que uma bela decoração e uma apresentação impecável poderiam ser tão importantes quanto o sabor do alimento – mesmo! Claro que eu tinha uma noção de como eram apresentados os pratos e bufês, mas ali, trabalhando no dia-a-dia do hotel, é que aprendi que a aparência, antes do sabor, é o cartão de visita da comida. É o famoso “comer com os olhos”. Desnecessário dizer que nenhuma apresentação salva um prato sem sabor (ou, pior, de sabor horrível), mas não era disso que se tratava.

Dentro da câmara fria a 25ºC negativos: aprendendo uma nova profissão...
A qualidade da comida era sempre elogiada, assim como a decoração e a sua apresentação. Não raro as equipes de cozinha e do salão – e alguns hóspedes - deixavam escapar lágrimas diante da mesa do jantar – juro! Isso geralmente ocorria naquelas ocasiões que eu – e todo mundo, acho – mais adorava: os jantares temáticos. Refeições temáticas são fantásticas, você pode, literalmente, viajar na maionese. Ou na carne. Ou no arroz. Com alguns temas, você pode realmente extrapolar, deixar sua imaginação fluir. Mas, é bom lembrar: sabor é importante, e viajar na decoração não quer dizer que está tudo liberado. Bom gosto na decoração e no sabor, bem entendido?
Jantar temático. Tema: "Pantaneiro". Dá prá viajar ou não dá?!?
Alguns temas eram recorrentes: a Noite Mexicana, o Jantar Jangadeiro (apenas com peixes e frutos do mar – inclusive as sobremesas), o Jantar Brasileiro. Temas geográficos são interessantes, você pode aproveitar a ocasião para divulgar e difundir um pouco da cultura dos povos. E os temas geográficos são, se não infinitos, inúmeros: Noite Peruana, Almoço Mediterrâneo, América do Norte e suas influências, Brasil (aí entra quase de tudo!), Europa, Ásia, África, Colônias Britânicas, Cozinha Francesa, México, Argentina, Tailândia, Japão, China, Coréia do Sul (não, não sirva cães ensopados...) enfim, qualquer país ou região do globo são ótimos temas para se explorar.
A tequila é sempre bem-vinda num jantar mexicano...
Temas históricos são fantásticos: o jantar da corte de Luis XIV, de Napoleão, da família real brasileira, do Império (qualquer Império: de Julio Cesar a Dom Pedro II, passando por Akihito, Constantino, Nero, entre outros tantos), dos faraós egípcios, de qualquer época ou personalidade histórica. Imagine a decoração do ambiente e dos pratos!
Mesa posta para o "Baile Imperial": receitas originais de 1877
Temas culturais são sucesso garantido. Pode-se aí misturar história com geografia, com uma pitada de ficção e muita imaginação. O estrelado chef Heston Blumenthal (do restaurante Fat Duck, freqüentador assíduo da lista dos melhores restaurantes do mundo) já preparou até um jantar inspirado em Alice no País das Maravilhas! O que impede você então de elaborar um menu inspirado em algum filme (sugestões: O Poderoso Chefão, Laranja Mecânica, E o Vento Levou – “nunca mais vou passar fome”, A Festa de Babetepara ou Vatel, um Banquete para o Rei – sugestões óbvias, desculpem-me...), seriado de TV, peça teatral ou livro? Nada te impede! Faça!!
O chef britânico Heston Blumenthal. Meio doido, ou não?!?
 Cores são outro tema bastante explorado. Azul, amarelo, preto, cores da bandeira do Brasil, do Suriname ou de Trinidad e Tobago. Vale tudo! Mas, neste caso, muito cuidado para não sufocar seus convidados com a mesma cor, no mesmo tom. É interessante usar diversas tonalidades de uma mesma cor, até porque, deste modo, seu trabalho vai ficar muito mais simples.
Enfim, tudo ao seu redor pode servir de tema para uma refeição inesquecível: objetos, cores, ingredientes, pessoas, esportes, sensações, amizades, lembranças e memórias. E você pode preparar sua refeição para seus amigos mais chegados, combinando com cada um deles a roupa a ser usada (que deve fazer parte do tema escolhido, claro). Será um momento de festa, de alegria, que com certeza será lembrado por todos.

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